quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Entre breques e solavancos

Olhando o ônibus lotado, fiquei a imaginar como seria o início de um romance em tais condições.
- Desculpe – diz o rapaz timidamente depois de pisar no pé da jovem ao seu lado. – Não consegui evitar. O motorista freiou de repente...
- Tudo bem – responde a bela morena olhando para um homem suado e com o braço erguido. – Tem coisa pior que isso...
- Você pega sempre essa linha? – anima-se o jovem.
- Sempre essa hora. E você?
- Também.
Silêncio. O sobe e desce continua.
Pouco depois os dois se olham pelos vidros do coletivo, que atuam como espelhos. Disfarçadamente ele a vê puxar a campainha. Decide saltar também. Quando o ônibus pára ele já está numa das portas de saída, com o pé na rua. Dá uma última olhadinha. Não vê a garota junto à outra porta. Entende na hora que ela apenas acionou a campainha para ajudar alguém. Confere. Lá está ela, espremida entre dois marmanjos, segurando uma sacola.
Ela não o tinha perdido de vista. Já trocara três vezes de lugar para continuar olhando em sua direção. Quando puxou a campainha para aquela senhora com um bebê ao colo viu que ele se aprontou para descer também. Chegou a tremer. Achava que ele pararia mais adiante, mais perto da vila onde ela morava. Surpresa. Ele só ficou na porta, não desceu. Resolve dar mais uma olhadinha. Seus olhos se cruzam. Ela sorri. Ele retribui. Sente um friozinho no estômago.
- Com licença...
É o jovem novamente. Reconheceu a sua voz sem que precisasse olhar diretamente para ele. Reúne coragem não sabe de onde e o encara. Nota que ele também está nervoso.
- "Agora eu encosto" – decide-se o rapaz, imaginando mil maneiras de dizer alguma coisa sem que nada concreto lhe viesse à mente. Pensa em lhe passar o telefone da firma onde trabalha, mas desiste. Sabe que não tem tempo a perder. Faltam apenas três paradas para chegar em casa. Arrisca.
- Você não é a namorada do Júlio (primeiro nome que lhe vem à cabeça)?
- Não. Por quê?
- Parecida...
- Eu nem tenho namorado – emenda ela, convencida de que se não ajudasse, a conversa iria morrer novamente.
- Não tem mesmo? – alegra-se o já não tão tímido rapaz.
- Verdade...
O motorista freia novamente. E os dois agradecem mentalmente por ficarem mais juntinhos...



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