terça-feira, 13 de julho de 2010

Trocando as buelas

Em 1986 mudei para uma cidadezinha na divisa com o Uruguai. Aos poucos fui notando que a proximidade da linha divisória propicia situações atípicas em todos os setores. Muita gente mora num país e trabalha ou estuda em outro. Fui contratado por uma rádio gerenciada por um uruguaio. O editor do jornal rival ao que fui Chefe de Redação também era do outro lado da fronteira. Observei ainda que todo brasileiro acha que entende o espanhol, ou castelhano como dizem por lá. Minha mulher, formada em Educação Física e com larga experiência em recreação, tambem achava que entendia. Estava eufórica com o novo emprego: uma escolinha infantil, que atendia crianças dos dois lados da fronteira.
Pouco antes do início da primeira aula, aparece uma senhora com um menino de uns quatro anos a tiracolo. Foi só ela sair pelo portão que a criança abriu o berreiro. E repetia sem parar: “yo quiero abuela, yo quiero abuela”. Querendo ajudar, minha mulher correu para o seu armário, apanhou uma bola de futebol e se dirigiu ao menino chorão.
– Pronto – disse carinhosamente. – Tá aqui a buela...
– No quiero, yo quiero abuela... – repetia o garotinho.
– Então pega a buela, vai... – insistiu ela, cheia de paciência.
– No quiero, no quiero... – dizia o coitado do castelhaninho, banhado em lágrimas.
– Não é essa a buela que você quer? Quer outra buela? De vôlei, basquete?
– No... Yo quiero abuela...
Nesse instante minha mulher, ja perdendo um pouco a calma, olhou para a diretora da escola como a pedir socorro. Foi quando notou que ela estava se contorcendo de tanto rir.
– O que foi? Não consigo entender que tipo de buela que ele quer... – justificou-se em seu portunhol sofrível.
A diretora respirou fundo e explicou a situação. O garotinho queria a sua avó. Em espanhol, avó é abuela. Já bola é pelota...



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